No apagar das luzes do governo Lula, o ministro da Educação, Fernando Haddad, homologou a recomendação do Conselho Nacional de Educação (CNE) que acaba com a reprovação nos três primeiros anos do ensino fundamental e cria o Ciclo de Alfabetização e Letramento.
Já a partir deste semestre, gestores de todas as escolas do Brasil podem decidir se continuam com o sistema seriado, mantendo a possibilidade de reprovação, ou se adotam a recomendação. A medida foi tomada, segundo a secretária de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC), Maria do Pilar Lacerda, a partir da constatação de que muitas crianças são reprovadas no primeiro ano:
- Tivemos um índice de aprovação de 94,9%, em 2009, o que nos mostra que, de cada cem crianças, cinco ainda são reprovadas logo que ingressam na escola. Pesquisas apontam que, se o aluno é reprovado, dificilmente terá sucesso. A recomendação, que não é lei, é para garantir que todas as crianças estejam alfabetizadas até os oito anos.
O Brasil tem, de acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), 31 milhões de alunos no ensino fundamental. Desses, quase dez milhões estão nos três primeiros anos. No entanto, pouco mais de dois milhões têm mais de cinco horas de aula por dia.
Polêmica, a aprovação automática divide educadores. Professor da USP, Ocimar Alavarsi, que já foi coordenador pedagógico da rede municipal de São Paulo, de 1995 a 2008, acredita que a "reprovação no ensino fundamental devia ser zero":
- Mais de 70 mil foram reprovados no primeiro ano em 2008, e isso não tem paralelo com outro país. A evasão escolar também é alta. Então, a recomendação é um avanço. Crianças devem ficar nove anos na escola, e o desafio é descobrir o que devemos fazer para que elas aprendam. Mesmo incompleta, já que o CNE não diz como as crianças devem ser acompanhadas, a recomendação abre o debate.
Para Susana Gutierrez, uma das coordenadoras do Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação do Rio (Sepe), a recomendação é "boa na teoria".
- Não segmentar o processo de alfabetização e acompanhar cada uma das crianças é bom. Mas, na prática, escolas têm salas superlotadas, muitas aulas de reforço são dadas por voluntários, professores têm pouquíssimo tempo para planejar as aulas e as condições de trabalho são ruins. A sensação é que as propostas não são feitas por quem conhece o dia a dia das redes - diz Susana.
- Mudar a forma de avaliar, sem permitir que um trabalho de qualidade seja feito, é um desrespeito.
Desde 2009, as crianças matriculadas na rede municipal do Rio de Janeiro já convivem com o que o CNE acaba de recomendar. Os alunos dos três primeiros anos são reprovados apenas ao final do terceiro ano.
No entanto, em 2007, o então prefeito Cesar Maia assinou decreto instaurando a progressão automática nos nove anos do ensino fundamental, dividindo o período em três ciclos. Em 2009, foram encontrados 13 mil alunos do 4 º e 5 º anos que precisavam ser realfabetizados, e outros 17 mil do 6º ano que também eram analfabetos funcionais.
- Crianças se alfabetizam em idades diferentes e achamos prudente manter a não reprovação no 1º ciclo - diz Claudia Costin, secretária municipal de Educação, que concorda com a decisão do CNE, mas faz um alerta:
- Não pode ser interpretada como algo que leve os professores a retardar o processo de alfabetização nas escolas públicas. Se for assim, o apartheid educacional aumenta. Cabe aos gestores não permitir que a medida prejudique os alunos.
Fonte: O Globo (RJ)
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